quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Viçosa (MG) sob os meus olhos


              Tenho que voltar, mãe, acorde.
              Voltar para aquele lugar desconhecido que agora chamo de meu. A vida presente me aguarda lá, acenando para mim, fingindo-se mãe, fingindo-se amiga, pedindo para que eu volte depressa, pois ela quer continuar.










A flor e a náusea


Preso à minha classe e a algumas roupas,
Vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjoo?
Posso, sem armas, revoltar-me'?

Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.

Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

Drummond.

Onde vive a poesia


Há poucos anos atrás, li numa revista sobre a periferia, sobre a poesia, sobre a poesia na periferia. A reportagem falava sobre saraus semanais que aconteciam em favelas paulistas. Os moradores se reuniam, cantavam músicas e declamavam poemas de própria autoria. Havia silêncio, respeito, brilho nos olhos, calor no corpo inteiro: desejo de libertação através das palavras miúdas. Aquilo me impressionou fortemente. Escrevi um conto. Conto pouco, fraco, capenga das pernas, coitado (dele, só restou o título deste post, que era também o seu). Hoje, por um formidável acaso, reencontrei a causa daquela minha forte impressão – mas não vou me atrever a escrever de novo, um conto daqueles.

O poeta e idealizador do projeto de construir literatura, ou desliteratura, na periferia atende pelo nome de Sérgio Vaz, meu novo herói de carne e osso. Ele fundou, há dez anos, o Cooperifa: o tal projeto, a luz no túnel aparentemente infinito. Há outros saraus em periferias de São Paulo, ele não está sozinho. Mas se tornou o ícone, uma das pessoas mais influentes do país, o pai; ídolo que não quer ser ídolo: quer ser gente com pé no chão, livre para voar; uma daquelas pessoas que “agem no mundo como centelhas”; gente que move montanhas, ou morros...

A flor da poesia nasceu no asfalto, furou a náusea, retardou o enjoo, e agora todos sentam no meio da rua para observá-la de perto. A flor é feia. Mas é uma flor. E só quem já leu alguma coisa um dia sabe o quanto essa plantinha minúscula – ou coceira intrometida, ou amor desmedido – transforma, faz nascer o jardim inteiro. Emociono-me mais uma vez por saber do Sérgio Vaz, apaixonado. Por saber dos filhos dele, mais apaixonados ainda. Choro de felicidade por saber que há esperança para esse país pouco, fraco, capenga das pernas, coitado. E que ela, a flor verde, está na favela, dentro da gente. Gente linda, inteligente.



Blog do Sérgio Vaz, do Cooperifa: http://www.colecionadordepedras1.blogspot.com.br/

terça-feira, 7 de agosto de 2012

1 filme



Sinopse:

Guiados pela paixão, os personagens deste filme vão penetrando num universo feito de armadilhas e vinganças, de desejos irrealizáveis, da busca incessante da felicidade. O universo aqui é o da vida-satélite e dos tipos que giram em torno de órbitas próprias, colorindo a vida de um amarelo hepático e pulsante. Não o amarelo do embaçamento do dia-a-dia e do envelhecimento das coisas postas. Um amarelo-manga, farto.


Trailer:



Fotos:




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